STF admite corte de salário de servidores públicos em greve
O supremo Tribunal Federal fixou nesta quinta-feira (27/10) uma trava para as greves dos servidores públicos. Por 6 votos a 4, os ministros consideraram legal o corte de ponto e desconto nos salários referentes aos dias de paralisação.
Pelo entendimento dos ministros, o órgão público deve aplicar o corte a partir da deflagração do movimento grevista.
Não haverá, porém, o desconto nos casos em que a greve for provocada por conduta ilegal do poder público, como, por exemplo, o atraso no pagamento dos salários ou resistência em negociar com a categoria. A decisão do STF, no entanto, não impede a possibilidade de acordo que permita a compensação ao invés do desconto salarial.
Para a maioria dos integrantes do tribunal, a medida representa um desestímulo às paralisações e não fere o direito à greve garantido pela Constituição. Na avaliação dos representantes dos servidores, a decisão do Supremo esvazia os movimentos grevistas.
No julgamento, os ministros levaram em consideração ainda o risco de greve generalizada que ameaça o governo Temer e os governadores em meio à crise financeira.
“O que ocorre numa visão realista, nós estamos num momento muito difícil e que se avizinha deflagrações de greve e é preciso estabelecer critérios para que nós não permitamos que se possa parar o Brasil”, disse o ministro Luiz Fux.
Os ministros discutiram um recurso (RE 693456) apresentado pela Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro (Faetec), que, em 2006, foi impedida pela Justiça estadual de realizar o desconto na folha de pagamento dos funcionários em greve. O caso tem repercussão geral.
A tese fixada para orientar as instâncias inferiores foi: “A administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do próprio poder público”.
Na sessão, o plenário se dividiu em duas correntes. Os ministros Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Gilmar Mendes, Luiz Fux e a presidente Cármen Lúcia admitiram o corte.
Os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello defenderam que apenas ordem judicial pode determinar o corte no pagamento.
A maioria do STF entendeu que o Estado não deve pagar por um serviço que não foi prestado. Relator do caso, o ministro Dias Toffoli votou há mais de um ano. Na época, ele destacou que a deflagração de greve pelo servidor público se equipara à suspensão do contrato de trabalho e, por esse motivo, os dias não trabalhados não devem ser pagos.
Para o relator, ainda que o movimento grevista não seja considerado abusivo, a regra deve ser o não pagamento de salários, a não ser que haja a compensação dos dias parados e o parcelamento dos descontos sejam objeto de negociação.
O desconto não será realizado se a paralisação for provocada por atraso no pagamento ou se, em situações excepcionais, justificar-se o afastamento da relação de trabalho. O ministro citou como exemplo situações em que o ente público ou o empregador tenha contribuído, mediante conduta recriminável para que a greve ocorresse.
“Qualquer decisão que nós tomarmos aqui não vai fechar as portas do Judiciário, seja para os servidores seja para o administrador público. O que estamos decidindo é se, havendo greve do servidor público, é legal o corte de ponto”, afirmou Toffoli.
Para Barroso, o atual regime é insuficiente para incentivar a rápida composição do litígio entre as partes. Ele afirmou que o movimento grevista tem um custo. “Quem deve bancar a decisão política de fazer greve? Eu acho quem quer greve não pode terceirizar o ônus. Tem que ser próprio”, disse.
O ministro Teori Zavascki afirmou que “não se está negando o direito de greve dos servidores. “A Constituição não assegura direito de greve com pagamento de salário. Não vejo isso na lei”.
Em tom irônico, Gilmar Mendes citou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e questionou se as paralisações em que funcionário público não sofre sanções equivaleriam a férias.
“A greve, no mundo todo, envolve a suspensão do contrato imediato. Quem dizia isso é o insuspeito presidente Lula. Greve subsidiada, como explicar isso?[…] É férias? Como sustentar isso? A rigor, funcionário público no mundo todo não faz greve. O Brasil é realmente um país psicodélico”, disse.
Primeiro a divergir da maioria, o ministro Edson Fachin disse que considera a adesão do servidor público ao movimento grevista como o principal instrumento de reivindicações do servidor público frente ao Estado e, por esse motivo, a suspensão da remuneração é um fator essencial na relação jurídica instalada a partir da deflagração do movimento paredista e não pode ser decidida unilateralmente.
“Permitir o desconto imediato no salário dos servidores públicos significa que os prejuízos do movimento paredista serão suportados apenas por uma das partes em litígio. Essa lógica praticamente aniquilaria o direito de greve no setor público”, concluiu o ministro Fachin.
Marco Aurélio Mello afirmou que sustentar que o corte de ponto seria um mecanismo para evitar a greve é um passo demasiadamente largo.
De acordo com Lewandowski, a decisão de cortar o salário não pode ser unilateral, precisando ser discutida com a Justiça. “Tenho muita resistência a estabelecer condições unilaterais para o exercício de um direito constitucional”, afirmou.
Márcio Falcão / Jota