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Contaminação de peixes amazônicos emite alerta sobre rio de Rondônia

Pesquisas da UFF investigam espécies do rio Machado e evidenciam o acúmulo de mercúrio e microplásticos no organismo desses seres

Pesquisas da UFF investigam espécies do rio Machado e evidenciam o acúmulo de mercúrio e microplásticos no organismo desses seres

A Amazônia possui a maior biodiversidade do planeta e sua bacia hidrográfica a maior diversidade de peixes de água doce do mundo. Contudo, a região passa por transformações decorrentes da atividade humana. Em diálogo com essa realidade, a Universidade Federal Fluminense (UFF), em parceria com a Universidade Federal de Rondônia (UNIR), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), estuda a contaminação por mercúrio e microplásticos em peixes do rio Machado, na Amazônia. O objetivo é compreender as mudanças e as características do ambiente aquático da região amazônica.

O rio Machado é a segunda mais importante bacia hidrográfica do estado de Rondônia. Ele deságua no rio Madeira e forma uma sub-bacia do rio Amazonas. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), mais de 50% da bacia do rio Machado foi desmatada até 2019. Atualmente, trechos do rio incluem áreas que sofreram alterações para abertura de pastagem, lavouras de soja, construção de centros urbanos e indústrias. A região amazônica possui, naturalmente, solos ricos em concentrações menores de mercúrio. No entanto, o desmatamento consiste na retirada da cobertura vegetal do solo e contribui para a introdução de mercúrio nos ambientes aquáticos, através do transporte do metal pela ação do sol e das chuvas.

De acordo com Igor David, docente do Departamento de Ciências Exatas, Biológicas e da Terra (PEB) e um dos autores do trabalho, estudar o mercúrio em peixes é importante para entender a dinâmica desse elemento nos organismos. “Os peixes se alimentam e também servem de alimento para outros seres vivos. Por isso, é fundamental compreender como esse poluente está se distribuindo entre os organismos na cadeia alimentar. Esse estudo é ainda mais relevante em relação ao homem porque é questão de saúde pública. Afinal, comer um peixe com qualquer tipo de contaminação, principalmente por mercúrio, pode gerar complicações.”

O mercúrio é um metal pesado e um poluente altamente tóxico, em razão da sua capacidade de acumulação ao longo da cadeia alimentar. A quantidade deste metal, encontrado em diversos ambientes da Amazônia, principalmente em ecossistemas aquáticos, pode ser consequência das atividades do homem. Na região do Machado, as principais fontes de contaminação da água são: esgotos domésticos, resíduos industriais, lixeiras irregulares e o escoamento de produtos químicos agrícolas. Esses fatores causam a poluição por substâncias tóxicas, como óleo, graxa, nitrogênio, fósforo, bactérias patogênicas (que causam doenças no ser humano) e metais pesados. O mercúrio é naturalmente encontrado na região em concentrações mais baixas. Porém, as ações humanas impulsionam o crescimento deste poluente (unindo a porcentagem natural com a decorrente do homem) no solo, na água, nos sedimentos, no ar, nas plantas e nos animais.

Em relação aos animais, algumas espécies de peixes carnívoros são bioindicadores, ou seja, indicam a presença de poluição em ambientes aquáticos. Dentre eles, podemos citar a corvina da espécie Plagioscion squamosissimus, peixe nativo da Amazônia e importante tanto para a economia da região quanto como fonte de proteína das comunidades locais. Por ser uma espécie carnívora, ela pode acumular altas concentrações de mercúrio, que são transferidas para o homem através do consumo.

Nesse sentido, o estudo verificou a concentração total de mercúrio presente em peixes P. squamosissimus do rio Machado. A análise utilizou amostras de cinco locais e examinou 64 tecidos musculares e 54 tecidos hepáticos, relacionando-os com o tamanho dos peixes, o sexo e os períodos do ciclo hidrológico. Os resultados confirmam que as concentrações de mercúrio (no músculo 1,09 ± 0,72 mg kg-1 e no fígado 1,28 ± 1,23 mg kg-1) estavam acima do permitido para consumo pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que estabelece 0,5 mg de concentração de mercúrio por grama. O estudo também observou que, quanto maior for o peixe, maior será a concentração de mercúrio.

“Essa região central do estado, muito próxima de onde foram coletadas as espécies, é uma região extremamente impactada pelo desmatamento. Portanto, vemos que isso é uma das principais questões. O desmatamento é um problema sério, principalmente nessa região central do estado de Rondônia. Ela não possui uma grande população, mas têm os impactos relacionados ao avanço do desmatamento e da pecuária no norte do país. Essas questões estão relacionadas à concentração de mercúrio”, explica Igor David.

A exposição de peixes ao mercúrio pode comprometer a reprodução, o crescimento e a imunidade. Os embriões expostos ao metal também podem desenvolver anormalidades, mudanças de comportamento e retardo no desenvolvimento, que reduzem as chances de sobrevivência. No ser humano, a intoxicação por mercúrio pode causar distúrbios, especialmente em grupos vulneráveis, como gestantes, bebês e crianças. O mercúrio pode afetar os seres humanos em diferentes níveis biológicos, causando danos ​​ao sistema nervoso e aos rins.

Rios da Amazônia também estão contaminados com microplásticos 

A poluição plástica torna-se ainda mais problemática quando ocorre a fragmentação do material, originando os microplásticos – que são fibras, fragmentos ou filmes plásticos que medem entre 0,1 e 5 milímetros. Os microplásticos são amplamente encontrados nos ambientes, difíceis de decompor e podem ser ingeridos por diversos organismos, como fitoplâncton, zooplâncton, camarões, peixes e grandes vertebrados. Além disso, esses materiais podem facilitar a transferência de poluentes de ambientes aquáticos para os seres vivos da região, resultando na biomagnificação (acúmulo de substâncias ao longo da cadeia alimentar) que atinge os seres do topo da cadeia.

Atualmente, os microplásticos são uma ameaça mundial à biodiversidade. O oceano é o destino final de muitos plásticos e microplásticos, enquanto os rios atuam como um importante caminho para esses materiais. Nesse sentido, estima-se que aproximadamente 80% dos plásticos do mar vêm de bacias hidrográficas. Portanto, mais de 1.000 rios são responsáveis ​​pelas emissões de plástico no oceano e mais de oito milhões de toneladas de resíduos plásticos chegam ao mar e aos rios anualmente.

A poluição por microplásticos assola a região do rio Machado e degrada a água doce da Amazônia. O estudo da UFF, em parceria com a Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e a Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), investigou a contaminação por microplásticos de peixes de 24 praias arenosas, coletados em uma área de proteção ambiental do rio Machado. As análises verificaram a caracterização dos microplásticos em relação às categorias das espécies na cadeia alimentar, ou seja, a quantidade do material encontrado no trato digestivo de 29 peixes comparada ao tipo de dieta.


Créditos: Arquivo pessoal do pesquisador

Os resultados apontam que, dos 1082 peixes analisados, 332 (30%) apresentaram microplásticos no aparelho digestivo. Os peixes onívoros (que comem animais e vegetais) e insetívoros (que comem insetos), das praias arenosas mais próximas dos aglomerados urbanos, possuíam mais microplásticos no organismo, enquanto os peixes carnívoros (que se alimentam de outros animais) apresentaram maior quantidade de microplásticos no trato digestivo. No total, foram encontradas 617 partículas de plástico nos tratos digestivos e cada indivíduo ingeriu uma média de 1,8 ± 1,6 microplásticos. A espécie Knodus heteresthes apresentou a maior quantidade de microplásticos no trato digestivo, seguida da Geophagus sp., Bivbranchia fowleri, Apareidon sp. e Bryconops caudomaculatus.

Em relação aos resíduos de partículas plásticas, o estudo constatou a ocorrência de fibras pretas (41%), azuis (18%), transparentes (14%) e os plásticos macios (8%) como predominantes. Os polímeros encontrados foram o polipropileno (32%), polietileno tereftalato (29%), poliamida (24%), polietileno de alta densidade (10%), cloreto de polivinilideno (3%) e o álcool etileno vinílico (2%).

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Além disso, quanto mais longe dos centros urbanos, maior seria a concentração de microplásticos. De acordo com Igor David, há duas explicações possíveis. Primeiro, os microplásticos são dispersos na água por fontes de poluição, como esgoto ou efluente industrial. “Tenho observado nos meus trabalhos que o grande motivo para a presença de microplásticos nos rios é o efluente doméstico. Nós, que trabalhamos com água doce, encontramos muita fibra de roupa, fibras azul e preta. Isso tem uma resposta: máquina de lavar. Lavamos a roupa, que é feita de plástico, e essas fibras se soltam das roupas”, enfatiza.

O Brasil não possui uma boa rede de saneamento básico. A região norte, por exemplo, detém um dos piores índices de saneamento básico do país. A água que sai das residências cai diretamente nos rios. Mesmo que a água passe por uma estação de tratamento, os filtros não “seguram” os microplásticos porque são partículas muito pequenas. Outra questão é que os microplásticos também encontram-se distribuídos na atmosfera.

Por fim, os estudos ressaltam a importância de ambos os temas para a atualidade e a necessidade de formular políticas públicas e estratégias para conservar a biodiversidade regional amazônica. Atualmente, Igor David e discentes da UFF utilizam o instagram (@microplasticosemeioambiente) como meio de divulgação de informações sobre microplásticos, impactos ao meio ambiente e saúde pública, com a finalidade de disseminar o conhecimento e conscientizar a sociedade sobre os problemas ambientais.

Igor David da Costa é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), mestre em Biologia de Água Doce e Pesca Interior pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e doutor em Ecologia e Evolução pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Atua como professor associado na Universidade Federal Fluminense (UFF). Docente permanente do Programa de Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos – Pólo ProfÁgua/UNIR – Campus de Ji-Paraná e Jovem Cientista do Nosso Estado (FAPERJ). Atua em projetos ecológicos com ênfase em Bioecologia de peixes marinhos (reef balls) e de águas interiores nos seguintes temas: ecologia de população e assembleias de peixes, ecologia trófica e reprodutiva, metais pesados, microplásticos em compartimentos bióticos e abióticos e pesca artesanal amazônica e no sudeste brasileiro.

 

Universidade Federal Fluminense

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