Com a seca histórica do rio Madeira em 2023, renasceram de novo as esperanças de que a BR-319 entre Porto Velho e Manaus, capital do Amazonas, volte a ser asfaltada. Inaugurada no ano de 1976, em pleno governo ditatorial-militar, com a lorota “integrar para não entregar”, a fatídica rodovia foi na época um dos maiores desastres ambientais do mundo e que quase levou ao fim total da Amazônia. Felizmente, no final da década seguinte a estrada, imprestável e totalmente desnecessária, foi, até os dias atuais, quase riscada do mapa e deu, dessa forma, mais algumas poucas décadas de sobrevivência à já devastada e explorada região de florestas e um dos biomas mais importantes de toda a Humanidade. Várias são as desculpas para se reconstruir o trecho de mais de 890 quilômetros da BR. “Vai tirar Manaus do isolamento”, dizem os destruidores da natureza.
Se Manaus quisesse mesmo sair desse tal “isolamento” não teria gastado um bilhão e 300 milhões de reais em 2007 para construir uma ponte no rio Negro para ligar a capital amazonense ao Cacau Pirera em vez de ligá-la à BR-319 no Careiro. Além do mais, essa ideia de asfaltar pela segunda vez a velha 319 só atende aos apelos dos devastadores do meio ambiente. A estrada é o coração da Amazônia ainda preservada. Sua construção é o tiro de misericórdia no que resta de floresta e de povos originários. E pior: não leva a desenvolvimento nenhum, pois quando se destruíram partes do Cerrado e da Amazônia ocidental para se pavimentar a BR-364, o resultado maior que se obteve foi Rondônia. E com certeza, este Estado incivilizado, pobre e distante não é nenhum exemplo de respeito ao meio ambiente e nem de qualquer resquício de desenvolvimento.
Será que quando existia a BR-319 totalmente asfaltada, havia esse progresso em abundância na região? Óbvio que não! E por que agora com a construção da estrada essa tal melhoria surgirá assim do nada? Fato: seus defensores querem é substituir a densa mata preservada por pastagens para alavancar o agronegócio e com isso, ficarem mais ricos e poderosos. Reconstruída, a rodovia teria pelos menos uns 150 quilômetros de cada lado para desenvolver atividades ligadas ao agro assassino e totalmente contrário ao meio ambiente. Devem ser criados também órgãos para extinguir de uma vez por todas os povos originários. Como foi feito com os Yanomamis, a “prosperidade” logo abre mão dessa “gente selvagem” que só serve para turbinar as ONG’s. O rio Madeira foi morto pela ganância do homem. O que custa agora matar também o que ainda resta da floresta?
Manaus e Porto Velho não têm nenhuma importância dentro da tosca realidade nacional. São cidades pobres, desarrumadas, sujas e imundas. Ligá-las por terra não trará, portanto, nenhum benefício ou serventia para ninguém. As duas cidades sempre foram ligadas pelo velho Madeira sem nenhum problema. Aí assorearam e depois mataram o rio com duas hidrelétricas só para justificar novas agressões ao já combalido meio ambiente. Com a BR-319 rasgando a Amazônia ao meio, a floresta não durará nem mais cinco anos e cidades inteiras com levas de gente pobre e miserável podem ir surgindo aos poucos onde antes havia a densa e preservada mata. Favelas, invasões, violência, fome, pobreza e miséria serão uma rotina, infelizmente. Com o desmatamento desordenado, as secas e os desastres ambientais virão com mais força e a região inteira pode se tornar inabitável em pouco tempo. Grileiros, invasores de terras, garimpeiros serão os donos da Amazônia.
*Foi Professor em Porto Velho.