A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em permitir que apenas as Câmaras de Vereadores analisem as contas de prefeitos enfraqueceu a efetividade da Lei da Ficha Limpa. De acordo com o ex-juiz eleitoral, Márlon Reis, um dos idealizadores da legislação, dados da Procuradoria-Geral da República apontam que cerca de 5 mil candidatos escaparam da inelegibilidade depois da decisão.
“A decisão do STF de desconsiderar a possibilidade de surgimento da inelegibilidade após a rejeição de contas pelo Tribunal de Contas no caso dos prefeitos ordenadores de despesas fragilizou muito fortemente a aplicação da lei da Ficha Limpa”, afirma Reis.
O especialista em legislação eleitoral garante, no entanto, que mesmo com a decisão do Supremo o número de candidatos afetados pela Ficha Limpa continua muito grande e até aumentou em relação à eleição passada.
Até a decisão da Corte ser tomada era necessária apenas a rejeição pelo Tribunal de Contas do município para que os prefeitos não pudessem mais se eleger. Entidades de classe do controle externo apontam a fragilização da Lei da Ficha Limpa.
Com a decisão do STF, se o Prefeito desviar o dinheiro público o Tribunal de Contas não poderá julgar as contas para determinar o ressarcimento do dano aos cofres públicos. Aos Tribunais de Contas sobrou o papel de auxiliar o Poder Legislativo municipal, emitindo parecer prévio e opinativo, que somente poderá ser derrubado por decisão de 2/3 dos vereadores.
Além de afetar expressivamente a Lei da Ficha Limpa, para entidades de classe do controle externo, a decisão reduz uma das mais importantes competências dos Tribunais de Contas, que é julgar as contas de quaisquer administradores e demais responsáveis pela aplicação de recursos públicos com base no artigo 71, inciso II da Constituição de 1988.
Minirreforma eleitoral
Nas eleições de 2016, Márlon Reis destaca de forma positiva os resultados da minirreforma eleitoral. “Apesar da inserção de algumas normas que reduzem a capacidade de controle da qualidade das eleições por parte da Justiça Eleitoral, o que observamos foi o poderoso e evidente impacto da proibição das doações eleitorais empresariais”, afirma.
Para o juiz, o fator econômico também influenciou o elevado número de votos nulos e abstenções. De acordo com ele, em eleições nas quais a mobilização ocorria de forma mercenária, isto é, pelo dinheiro, tínhamos uma frequência maior do eleitorado nas urnas.
“Não podemos, no entanto, retroceder e voltar a ter eleições caríssimas. É um preço que não merece ser pago, pois envolvia a mobilização de setores que, muitas vezes, iam votar de forma mercenária, em troca mesmo, de apoio material. Esses segmentos, eu me arriscaria a dizer, são os que mais contribuíram para o aumento da abstenção”, afirma.
Transparência
Outro ponto destacado por Reis é o aumento da transparência e disponibilidade de dados sobre as eleições. “Vimos o surgimento de uma boa oferta de aplicativos que começam a explorar esses dados, tornando-os não somente mais públicos, mas mais acessíveis. Isso está dentro de um lógica que deve imperar nas eleições: a transparência é o maior fator de coibição da corrupção”, explica.
Dyelle Menezes / Contas Abertas