Calama/RO, onde pulsa o Brasil

A simpática e bela vila de Calama, situada na divisa entre os Estados de Rondônia e Amazonas é um desses lugares paradisíacos que em muitos aspectos lembra muito bem a realidade do Brasil inteiro. Tive o indescritível prazer de conhecer e morar no distrito bem no início da década de 1980, onde por cinco anos fui professor e depois diretor da Escola General Osório.  Mesmo sendo uma réplica do país, Calama tem peculiaridades incríveis jamais vistas no mundo inteiro. Durante a década de 1980, por exemplo, o lugar já dispunha de placas solares para a captação de energia solar, mas não usava a conhecidíssima tração animal. Ainda hoje os moradores da simpática vilazinha usam o telefone celular através da precária internet local, mas não dispõem de ligações em seus aparelhos. Lá não tem torre de telefonia celular e a telefonia móvel também desapareceu.

No aspecto da política, Calama não difere muito de outras milhares de localidades espalhadas por este Brasil afora. De um modo geral, as autoridades nunca lhe deram muita importância, pois são muito poucos os eleitores inscritos na localidade. Mal elegem um vereador para a capital Porto Velho. Por isso a precariedade em todos os sentidos é muito comum. Um vereador, geralmente nascido em outra localidade, apresenta alguém para ser nomeado administrador do distrito. Calama tem um “hospital” que sempre funcionou a duras penas, apesar dos esforços hercúleos dos funcionários ali lotados. A Escola General Osório teve um bom ensino médio e hoje alguns de seus esforçados alunos fazem o ENEM em Humaitá no Amazonas. O nome da principal escola do distrito homenageia uma pessoa que em nada contribuiu para a existência do lugar. E no Brasil inteiro é assim.

Os professores de Calama, desde a minha época e apesar das muitas dificuldades encontradas, são os verdadeiros heróis desconhecidos, que levam conhecimento e vivência para todos. Em Calama eu aprendi muito mais do que ensinei. Mas a “Veneza esquecida do Madeira” merece bem mais atenção. O agressivo barranco logo a sua frente parece querer se vingar da inépcia das autoridades e por isso todo ano avança sem tréguas. Por causa da geografia da região, Calama pode ter surgido bem antes do que a capital Porto Velho. Porém, em meio a tantos dissabores, o ribeirinho calamense mostra o que poucos porto-velhenses têm: alegria, simplicidade, honestidade e acima de tudo muita hospitalidade. As pessoas de Calama, no geral, são como velhos irmãos: acolhem todos sem nenhuma distinção. Mas Porto Velho sempre está de costas para Calama e o Madeira.

Calama tinha que ser diferente do Brasil. O nome de sua maior escola, por exemplo, deveria mudar. Deveria se chamar Escola Professor Goldsmith Correa Gomes. Quem não se lembra do lendário professor Godi? O comerciante Joaquim Pires, dona Mercedes, Gegé Pantoja, Sr. Permínio, senhor Benjamim Silva do posto de saúde, Sr. Alfredo Teles, um administrador irretocável. “Seu” Branco da Ceron. “Seu” Zui. Dona Safira do São Francisco. São tantos os nomes das grandes figuras calamenses que já se foram que é impossível citar todas elas aqui. Até um crime histórico já se cometeu na esquecida vilazinha. “Mataram” de propósito o velho casarão do padre. A centenária construção era um dos poucos símbolos do Segundo Ciclo da Borracha em terras rondonienses. Mas foi derrubada sem deixar vestígios. Como acontece também em Porto Velho e no Brasil. Só que Calama resiste bravamente e assim povoa os corações e mentes.

*Por professor Nazareno, foi professor em Porto Velho

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