Rondônia supera Pará em número de mortes no campo e preocupa procuradora da República
A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados quer ampliar o investimento e a segurança jurídica dos programas de defensores de direitos humanos.
As metas foram estabelecidas nesta quarta-feira (26), em audiência pública que debateu o impacto da reestruturação do governo federal sobre três programas de proteção: a vítimas e testemunhas (Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas – ProVita), a crianças e adolescentes (Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte – PPCAM) e aos próprios defensores ameaçados de morte (Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos – PPDDH).
Deputados de oposição, como a ex-ministra de Direitos Humanos Maria do Rosário (PT-RS), denunciaram ameaças de descontinuidade dos programas. “A descontinuidade coloca em risco vidas: vidas de defensores, vidas de testemunhas e vítimas e vidas de crianças e adolescentes ameaçados de morte. E nós temos tido relatos de descontinuidade no financiamento, no apoio, no aporte de recursos e na atenção”, disse a deputada.
Representantes de vários fóruns e comitês de defensores dos direitos humanos admitiram preocupação com o atual quadro, sobretudo diante da tendência de aprovação, no Congresso, de emenda constitucional (PEC 241/16) que limita os gastos públicos. A PEC já foi aprovada pela Câmara e foi encaminhada para análise no Senado.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Padre João (PT-MG), anunciou articulações em torno de uma emenda do colegiado ao orçamento da União para garantir o aporte de R$ 50 milhões para os programas.
O deputado Lincoln Portela (PRB-MG) também sugeriu investimentos por meio de emendas parlamentares, que têm execução orçamentária obrigatória por parte do Poder Executivo.
Integrante do Fórum Nacional de Entidades Gestoras dos Programas de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, Inácio da Silva citou alguns temores em relação à redução de recursos. “[O programa] já tem sofrido uma estagnação nos últimos anos e a previsão no orçamento para o ano que vem nos preocupa muito. Houve, nos últimos anos, o fechamento de cinco programas. Isso significa diminuição do território de proteção e da capacidade de acolhimento da demanda que possa haver”, declarou.
Regulamentação
Também houve queixas quanto à falta de um marco legal que garanta aos programas segurança jurídica e perfil de política de Estado. Dos três programas debatidos, apenas o ProVita, que protege vítimas e testemunhas, é amparado por lei (9.807/99). Os demais são regulados por decreto presidencial.
Um projeto de lei do Poder Executivo (PL 4575/09) institui o Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos e já está pronto para votação no Plenário da Câmara. No entanto, novas propostas poderão surgir de grupos de trabalho montados no governo Temer e no Conselho Nacional de Direitos Humanos.
A representante do Comitê de Defensores de Direitos Humanos, Luciana Pivato, também manifestou preocupação com o destino dos programas diante do atual quadro, segundo ela, marcado pela criminalização dos movimentos sociais. “O programa não cuida apenas de pessoas, porque o conceito de defensor e defensora de direitos humanos inclui as coletividades, os grupos e os movimentos sociais. Por vezes, o caso é o de uma comunidade quilombola inteira, ou um povo indígena inteiro ou uma comunidade urbana inteira”, afirmou.
Esses programas estavam sob a responsabilidade da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e, no governo Temer, passaram para a órbita do Ministério da Justiça. O ministro da pasta, Alexandre de Moraes, foi convidado para a audiência pública, mas não compareceu. A diretora do Departamento de Defesa dos Direitos Humanos do ministério, Karolina de Castro, mostrou-se disposta a discutir problemas administrativos dos programas, como os relacionados a convênios e prestação de contas, mas garantiu que os repasses financeiros estão em dia.
“Nós tivemos um problema na integração da estrutura da Secretaria de Direitos Humanos dentro do Ministério da Justiça. Entretanto, todos os repasses que estavam pendentes foram feitos e hoje não existe nenhuma parcela pendente. Todos os pagamentos estão regularizados e em dia. E é fundamental a gente ter em mente que os estados também são cofinanciadores dessa política”, disse Karolina de Castro.
De acordo com o governo, pouco mais de 1.700 pessoas são beneficiadas pelos três programas de proteção (393 defensores no PPDDH, 420 vítimas e testemunhas no ProVita e 348 crianças e adolescentes e 579 familiares no PPCAM). O orçamento para 2016 está em torno de R$ 30 milhões (R$ 3,7 milhões para o PPDDH, R$ 14,2 milhões para o ProVita e R$ 13,1 milhões para o PPCAM).
Aporte de recursos
A procuradora federal dos Direitos do Cidadão da Procuradoria-Geral da República, Deborah Duprat (foto), também participou da audiência pública e enalteceu a figura dos defensores de direitos humanos. “É preciso reforçar que o defensor tem uma luta que merece ser continuada. O agressor quer tirá-lo da luta. A filosofia do programa é a máxima exposição do defensor para visibilizar a luta e mostrar que há uma rede de proteção aos direitos humanos. E isso envolve muito aporte de recursos”, disse.
Duprat manifestou preocupação com a tendência de redução de investimentos também em reforma agrária e demarcação de terras indígenas e quilombolas. Como exemplos de que os problemas em torno dos programas de proteção devem ser superados com urgência, ela citou casos de ação de milícias armadas no interior do País e o fato de Rondônia acabar de superar o Pará em número de mortes no campo.
Duprat e Inácio da Silva são favoráveis à retomada das discussões em torno da criação de um fundo financeiro para financiar a proteção aos defensores.